Justiça anula justa causa de funcionária que estava com maconha no trabalho
Juiz do Trabalho considerou que legislação não prevê dispensa por justa causa por porte de droga
O juiz Flavio Antônio Camargo de Laet, da 13ª Vara do Trabalho de Guarulhos (SP), anulou, no último dia 6 de julho, a demissão por justa causa de uma empregada que portou maconha no ambiente de trabalho. O magistrado considerou não haver previsão legal para dispensa motivada por mero porte de droga.
A empresa, do setor de logística e transporte, disse que demitiu a funcionária por ato de indisciplina, com fundamento no artigo 482, “h”, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Segundo a companhia, a empregada consumiu o entorpecente nas dependências da transportadora e durante o horário de trabalho.
A maconha foi encontrada no armário da funcionária, em uma bolsa, após uma revista pessoal de rotina.
Camargo de Laet julgou que, embora o porte de droga possa configurar crime, o fato de a trabalhadora ter “apenas portado o entorpecente, durante seu expediente na reclamada, não gerou qualquer prejuízo à relação de emprego existente entre as partes”.
O magistrado frisou que a legislação trabalhista prevê a possibilidade da demissão por justa causa na hipótese de prática de crime somente após a condenação transitada em julgado (quando ela se torna definitiva), conforme o artigo 482, “d”, da CLT.
“No mais, não há comprovação — e sequer alegação — de que a obreira tenha feito o uso de droga no ambiente de trabalho
e durante a jornada de trabalho, como falsamente asseverou a reclamada em sua defesa.”
De acordo com o juiz, se a empresa descobre que um dos empregados é usuário de entorpecente, pode demiti-lo por não concordar com o uso de drogas, mesmo que fora do ambiente de trabalho. “Mas, aí, o desligamento deverá ocorrer ‘sem justa causa’, e com o pagamento de todas as indenizações correspondentes a esse tipo de rompimento do vínculo.”
Camargo de Laet condenou a companhia ao pagamento do aviso prévio indenizado proporcional e projeções, do 13º salário proporcional, das férias proporcionais, com a parcela de um terço, e do FGTS integral somado à multa de 40%.
O processo tramita no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2), sob o número 1000268-56.2023.5.02.0323.
STF julgará descriminalização do porte de drogas
O Supremo Tribunal Federal (STF) julgará a constitucionalidade da criminalização do porte de drogas para consumo próprio na próxima semana. O Recurso Extraordinário (RE) 635.659, com repercussão geral reconhecida, em que a matéria é discutida, encabeça a pauta de quarta-feira (2/8).
O caso trata de maconha e de outros drogas.
O processo tramita na Corte desde 2011. Ele foi paralisado por um pedido de vista de Teori Zavascki em 2015. Alexandre de Moraes, que substituiu o ministro morto em 2017, devolveu a
vista no ano seguinte. Desde então, o Supremo não retomou o julgamento.
Relator do processo no STF, o ministro Gilmar Mendes votou contra a criminalização do porte de drogas para uso e não fez diferenciação em relação a nenhum tipo em específico. Na prática, para ele o artigo 28 da Lei 11.343/2006 é inconstitucional e, no lugar de responsabilidade de natureza penal, o flagrante de drogas para consumo próprio deve ser punido administrativamente. No entendimento do ministro, a norma “conferiu tratamento distinto aos diferentes graus de envolvimento na cadeia do tráfico (art. 33, §4º), mas não foi objetiva em relação à distinção entre usuário e traficante. “Na maioria dos casos, todos acabam classificados simplesmente como traficantes”, diz Mendes em seu voto.
Então recém-chegado na corte, o ministro Edson Fachin chegou a pedir vista, mas devolveu o processo no mês seguinte, em setembro de 2015. O posicionamento dele abriu uma divergência em relação ao relator: Fachin defendeu a descriminalização do porte apenas da maconha, excluindo a possibilidade de outras drogas. Para o ministro, “se o legislador já editou lei para tipificar como crime o tráfico de drogas, compete ao Poder Legislativo o exercício de suas atribuições, no qual defina, assim, os parâmetros objetivos de natureza e quantidade de droga que devem ser levados em conta para diferenciação, a priori, entre uso e tráfico de drogas”.
O terceiro a votar foi o ministro Luís Roberto Barroso, que acompanhou Fachin contra a criminalização do porte de maconha para uso próprio e excluiu outras drogas dessa possibilidade. A diferença principal entre os entendimentos dos dois é que Barroso estabeleceu parâmetros: considerou a quantidade de 25 gramas como limite entre quem é usuário e quem é traficante, assim como é aplicado em Portugal. No voto, o ministro afirmou ter cogitado um limite de 40 gramas, mas reduziu a quantidade em busca de consenso na corte.
Em relação ao cultivo de pequenas quantidades para consumo próprio, o limite proposto é de 6 plantas fêmeas. Para o ministro, “o indivíduo que fuma um cigarro de maconha na sua casa ou em outro ambiente privado não viola direitos de terceiros. Tampouco fere qualquer valor social. Nem mesmo a saúde pública, salvo em um sentido muito vago e remoto. Se este fosse um fundamento para proibição, o consumo de álcool deveria ser banido. E, por boas razões, não se cogita disso.
Note-se bem: o Estado tem todo o direito de combater o uso, fazer campanhas contra, educar e advertir a população. Mas punir com o Direito Penal é uma forma de autoritarismo e paternalismo que impede o indivíduo de fazer suas escolhas existenciais. Para poupar a pessoa do risco, o Estado vive a vida dela. Não parece uma boa ideia”. Barroso deu sinais de que essa argumentação poderia valer não só para a maconha, mas na época afirmou ter dúvidas sinceras e profundas sobre uma decisão mais ampla.
O recurso é contra uma decisão do Colégio Recursal do Juizado Especial Cível de Diadema (SP).
Fonte: JOTA