Que fatores levam empresas a contratar escritórios de advocacia? Uma pesquisa responde
Dissertação de mestrado mostra que departamento jurídico prefere focar em atividades que demandam alto conhecimento do negócio
Por que e para quais atividades os diretores jurídicos decidem contratar escritórios de advocacia? Essa foi a pergunta que o advogado Leonardo Maciel Benedete se propôs a responder em seu mestrado em Economia na Universidade Federal do Paraná.
Na sua dissertação, defendida no final de 2023, o advogado mostra que a alta frequência da atividade e a especialidade jurídica da demanda são os principais fatores que levam as empresas a procurar serviços jurídicos externos.
Isto porque, internamente, o departamento jurídico dá preferência por executar atividades que demandam um alto conhecimento do negócio, como elaboração de contratos e análise regulatória.
“É uma mensagem clara para os escritórios de que as empresas buscam bancas que consigam absorver grandes volumes de trabalho. A expectativa delas é transferir essas atividades, sejam simples ou complexas, para terceiros, internalizando as tarefas que demandam conhecimento do negócio”, diz Benedete.
As conclusões são fruto de um estudo empírico que ouviu, em setembro de 2023, coordenadores, gerentes, diretores e líderes dos departamentos jurídicos de 51 empresas que atuam em 26 setores diferentes. Em comum, todos os entrevistados atendiam ao critério de poder contratar escritórios externos em nome da companhia.
O questionário utilizado pelo pesquisador foi estruturado com base em um formulário utilizado pelo Centro de Profissões Jurídicas da Harvard Law School no estudo Globalization Lawyers and Emerging Economies (GLEE).
Alto risco
Uma das hipóteses iniciais de Benedete, que não se provou verdadeira ao longo do mestrado, foi baseada na teoria econômica da agência. O pesquisador levantou a hipótese de que o principal fator de delegação de uma atividade para um escritório seria o seu risco e que casos de risco sempre seriam transferidos para uma grande banca jurídica.
A ideia por trás dessa hipótese é a de que o departamento jurídico da empresa estaria transferindo o risco que cairia sobre ele para um prestador externo qualificado, independentemente do que fosse melhor para a companhia.
Após analisar os dados coletados, Benedete concluiu que o risco não é a principal razão de delegação das atividades. “Os casos de risco representam 20% do total delegado e consomem proporcionalmente o orçamento do jurídico. Os departamentos jurídicos não gastam mais com questões de risco do que com temas cotidianos”, diz o pesquisador.
A hipótese de que os casos de risco sempre seriam transferidos necessariamente para os grandes escritórios de advocacia também não se comprovou. Do total de casos de risco delegados, os respondentes disseram que enviam somente de 0 a 10% para os maiores escritórios.
“O resultado me parece contraintuitivo, esperava que houvesse prevalência maior das grandes bancas. Pode indicar uma tendência de mercado de que as empresas estão preferindo escritórios mais abrangentes”, diz o pesquisador.
Demandas para escritórios
Não é só a alta frequência de uma determinada demanda que é considerada na hora de terceirizar ou não determinada atividade jurídica. A pesquisa observou que a elaboração de contratos, apesar de ser uma demanda frequente, é normalmente internalizada, já que requer conhecimento do negócio. O oposto também acontece. Algumas demandas pouco frequentes, como as relacionadas a concorrencial, arbitragem e fusões/aquisições, tendem a ser feitas externamente.
“Os quesitos repetição e especificidade parecem ter uma relação inversa com a internalização, com preferência para atividades específicas serem resolvidas pelo jurídico interno, enquanto atividades com maior grau de repetição seriam transferidas aos escritórios”, afirma Benedete.
Os dados mostram que as demandas jurídicas que as empresas menos internalizam são as relacionadas com arbitragem, trabalhista, concorrencial e tributário. Do total do orçamento destinado para a contratação de escritórios externos, 80% é destinado para demandas de contencioso.
Benedete levanta a hipótese de que os escritórios podem atuar como um redutor de assimetria informacional acerca do mercado jurídico para as empresas. Como eles representam vários clientes, estão mais habituados aos processos e conhecem os atores, podendo orientar a empresa a tomar melhores decisões.
“Como viabilizar uma operação internacional ou mapear o risco de uma operação de fusão e aquisição? Muitas vezes o jurídico interno não tem braço ou conhecimento jurídico para fazer esse tipo de atividade”, diz o pesquisador.
Trabalho interno
Já o jurídico interno tem o papel de executar as atividades altamente específicas da empresa, como gestão, geração de indicadores e serviços jurídicos relacionados ao negócio. Oito em cada dez respondentes do questionário disseram que “nunca, quase nunca ou esporadicamente” fazem atividades comumente associadas à atuação dos advogados, como execução de petições e análises jurídicas clássicas.
“O jurídico não é mais visto como o ‘policial’, que atua para dizer não para a área comercial. Hoje, se espera que o jurídico conheça muito bem a empresa e ajude a diretoria a tomar decisões que exponham menos a companhia e maximizem as chances de que a direção que a empresa quer tomar seja exitosa”, diz Benedete.
Segundo o autor da pesquisa, o fato de os entrevistados terem dito que respondem, majoritariamente, para gerentes jurídicos, diretores jurídicos e presidentes corrobora a ideia de que hoje o jurídico tem mais prestígio dentro da hierarquia empresarial. Há alguns anos, quando ainda tinha o papel de ser ‘o policial’ o jurídico costumava ser subordinado a setores como o financeiro ou de recursos humanos.
Para o pesquisador, a tendência é que com o tempo, a divisão de trabalho jurídico entre os times internos e externos continue se aprofundando. “Me parece, com base no que foi levantado, que a ideia é ter um time interno especialista na empresa e enviar o trabalho repetitivo para os escritórios”, diz Benedete.
O pesquisador também pontua que conforme as empresas aumentam a sua operação, a tendência é que elas necessitem de conhecimentos jurídicos mais complexos e específicos. Nesses casos, o time interno acaba contando com a ajuda de alguns escritórios especializados parceiros para fazer aquisições ou abrir filiais internacionais.
Fonte: Jota